quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Lidando com o Conflito no Campo Missionário

Lidando com o Conflito no Campo Missionário

Marta Carriker

A possibilidade de conflito no campo missionário é uma realidade. Ao escrever esta frase, estou ciente de um conflito em andamento, ainda sem perspectiva de resolução: Um missionário estrangeiro e o obreiro nacional, com estilos de trabalho diferentes, ambos cristãos sinceros, se desentenderam a tal ponto, que hoje não estão se falando. O que fazer diante dessas situações?
Na minha opinião, em primeiro lugar é necessário reconhecer a normalidade da existência de conflitos. Como a paz é parte do fruto do Espírito Santo, nós, cristãos, temos dificuldade em aceitar que conflitos são parte normal da vida. Mas, a verdade é que, cada vez que encontramos opiniões diferentes – o que é bem comum quando há mais de uma pessoa em uma sala, ou em um projeto – temos a semente de um conflito.

Na vida do missionário, quais seriam algumas situações que comumente trazem conflitos? Segundo Marge Jones e E. Grant (Psychology of Missionary Adjustment), o conflito já pode aparecer na definição do local de trabalho do missionário. Quem resolve qual o melhor local? Seria a agência, o missionário ou a igreja local? Logo a seguir, quem resolve qual vai ser o trabalho desse missionário? Suponhamos que o missionário tenha sido preparado para uma tarefa e ao chegar ao campo se depare com uma necessidade em outra área. A igreja local pode esperar que ele realize algo para o qual não foi treinado. Ele pode achar que só deve fazer aquilo que tinha planejado antes de chegar ao campo. Um terceiro motivo citado como gerador de conflito é a administração de recursos. Quem cuida da distribuição dos fundos para projetos? E como se compara o estilo de vida do missionário e o dos obreiros nacionais? Tudo isso torna o relacionamento entre eles complicado.

É por isso que Bill Taylor (Too Valuable to Lose, p. 358) afirma que “É necessário enfatizar (no ministério prático pré-campo, bem como em toda orientação e preparo oferecido) a necessidade de possuir habilidade para lidar com relacionamentos no trabalho missionário. Pessoas monoculturais, que sempre trabalharam em estruturas hierárquicas autoritárias terão dificuldades em missões. Quantos grupos são desfeitos por razões teológicas? Alguns, é lógico. Mas muitos mais se desfazem por conflitos entre pessoas. Precisamos treinar homens e mulheres com capacidade para liderar e para seguir a liderança. E vamos precisar da franqueza para recomendar que alguns não trabalhem em missões.” Creio que nessa afirmação surgem questões importantes para a resolução dos conflitos: Há respeito mútuo entre o missionário e o obreiro nacional, ou entre o missionário antigo e o novo? Há participação nas decisões? Alguém é, de fato, a autoridade? Quem é o líder? Quem é o seguidor? Entre missionários e obreiros nacionais, é muito importante que o missionário se veja como servo e como seguidor, que ele se perceba não só como portador das boas novas, mas, também como quem encarna as boas novas, sendo bênção para a igreja local.

Num tom mais positivo, David Augsburger (Conflict Mediation Across Cultures) fala sobre a resolução de conflitos transculturais, partindo de quatro proposições básicas: 1) Nossos padrões de pensamento, em que existe apenas um lado que está certo (ou um ou outro) numa discussão, e em que um lado sempre ganha e o outro perde devem ser superados. Todo pensamento conflitivo e competitivo sobre o conflito nos impede de buscar uma solução alternativa; 2) As pessoas mais diretamente ligadas a uma disputa são geralmente as piores qualificadas, em pior posição e as menos capazes de resolver a disputa de forma construtiva… Um mediador se torna essencial, alguém de fora, que não pense de forma “ou um ou outro está certo” e que não aplique conflito para resolver conflito; 3) Transculturalmente, o conflito confunde nossas teorias, nossos contratos sociais e nos confronta com nossa ignorância sobre a interação humana; e 4) Reconhecer e melhorar a sabedoria de cada cultura sobre como lidar com conflitos é preferível a criar uma ciência universal sobre o conflito e a negociação.

As propostas deste autor apontam para a necessidade de percebermos diferenças culturais sobre como lidar com conflitos. O que dizem nossos amigos nacionais? Como podemos começar a conversar? Ao mesmo tempo, será que minha cultura tem uma forma interessante de fazer as pazes? Posso ensinar isso, com cuidado? O mais importante é a observação de que resolver conflitos não é determinar quem está certo e quem está errado, e sim descobrir uma forma de restabelecer um relacionamento quebrado, de criar condições para um trabalho conjunto.

Terminando, cito novamente este autor (Op. Cit. p. 11 ): “O conflito é uma crise que nos força a reconhecer explicitamente que vivemos com realidades múltiplas e precisamos negociar uma realidade em comum; que trazemos a cada situação histórias diferentes – e frequentemente contrastantes – e precisamos criar juntos uma única história compartilhada, com um papel para cada um e um papel para ambos.”

Possam essas palavras trazer ânimo àqueles que estão enfrentando conflitos. Que o Senhor possa providenciar mediadores e fornecer a criatividade para estabelecerem um plano de ação que seja inclusivo e reflita o Seu amor.